quinta-feira, 25 de junho de 2009

Cenários da Terra 03: Festa de Parazinho

Cenários da Terra:


Festa do Parazinho, Antigamente


Parazinho, Granja-Ce



Foto aérea Festa do Parazinho na década de 80

Assim que li esse texto, uma crônica, que o saudoso Raimundo Pompe publicara no jornalzinho impresso Lira Granjense só tive um sentimento: Alegria. Pois o relato que esse belo escritor descreve é o que centenas de romeiros e visitantes conviveram e que traz aquele sentimento de falta, mas que é gostoso de sentir: a Saudade. Mesmo sendo eu jovem, me reencontrei com diversos fato descritos nesse relato e ampliei meus conhecimentos sobre nossa festa em vários outros...


A aqueles que já vieram a Festa de Nossa Senhora em Parazinho durante o mês de junho espero que aproveitem bem a leitura e desde já agradeço ao amigo Lira Dutra por expôr essa maravilhosa pérola de nossa cultura local  cearense. Boa Leitura!!!




"Há quem considere o passado um elástico temporal, na medida em que está sempre a se repetir na memória das pessoas, sobretudo daqueles que viveram na intensidade da sua plenitude. E para fazermos uma viagem no tempo, escolhemos um dos nossos acontecimentos mais marcante: “A Festa de Nossa Senhora do Livramento do Parazinho”.
Vejo pelos olhos da memória e recordações sentidas o tempo onde todos ansiosamente aguardavam o início dos festejos. A felicidade se manifestava na alma e no coração do povo, que todo ele palpitava numa sugestão de alegria. A festa era de todos. Desde a criança que sonhava em aproveitar os dez dias de intensa animação, aos mais velhos, alguns já curvados pelos anos, com os olhos marejados de saudade ao recordar seu tempo de mocidade.

A cada ano a Festa ostentava mais fulgor. Durante todo o período festivo, o tristonho e sonolento Parazinho transformava-se num lugar vibrátil e trepidante. Uma massa incomputável enchia o lugarejo. Vinha invariavelmente gente dos mais diferentes lugares. Até de outros Estados. Os que vinham de longe chegavam em lotações do tipo “Jardinheiras” e “Mistos”, meio de transporte bastante comum naquela época, e ficavam alojados em redes, nas próprias carroçarias dos caminhões.
A viagem não era muito prazerosa. Faltava terraplenagem e, portanto, sobravam buracos na sua antiga estrada. Mesmo assim, jipes, caminhonetas e caminhões paus-de-arara, apinhados de gente, depois de atravessar o rio Coreaú, aqui na Granja, ainda com muita água, invadiam aquela carroçável estreita e tortuosa, deixando o rastro fulgaz de poeira naquela paisagem buliçosa.
Meu pai era “choffer” de praça e possuía um velho jipe, ano 54, de fabricação americana. Desde criançola eu adorava acompanhá-lo nas suas viagens ao Parazinho. Lembro-me que durante as quatro léguas de percurso, era comum se encontrar pessoas a cavalo e outras dezenas a pé, com direito a descanso naquela velha casa alpendrada, no “Mato Grosso”. O areal seco da estrada exauria as canelas dos devotos, que só sentiam alivio quando avistava as “cruzinhas”. Era sinal que a caminhada estava quase no fim.

Mas nem a exaustiva caminhada, nem os sacolejos e balanços das carroçarias dos caminhões eram suficiente para roubar o ânimo dos fiéis que, com as roupas e os cabelos embatumados de poeira, invadiam as ruas da antiga povoação, alegres e trêfegos, como um “pierrô” em baile carnavalesco.

A entrada era pelo mesmo lugar. De longe dava para se ouvir os foguetes pipocando no ar e o timbre sonoro e forte do sino da igreja chamando os fiéis para a oração. Em pouco tempo a igreja estava “tinindo” de gente para participar das missas e novenas, soleníssimas. Parece que estou vendo os vivas exaltados, as procissões ruidosas e os leilões concorridíssimos, num atestado eloqüente da mais acentuada fé. Relembro com saudade aquela magnífica banda de música executando lindos dobrados nas alvoradas frias de junho, numa harmonia inebriante na sua riqueza de ritmos e de sons, cujas músicas ainda me soam os ouvidos. Quanta coisa bonita, pontilhada de ternura!

Quando me apercebi da vida e comecei a raciocinar o vigário era o padre Benedito Albuquerque, que com simpatia e jeito recebia seu rebanho. Ouço muito falar da época em que monsenhor Vitorino era vigário, porém a minha pouca idade não me permite lembrar desde ilustre conterrâneo. Consoantes os que me afirma, era um homem respeitado por todos e, portanto, seu nome merece ser lembrado. Deixou este mundo, faz anos.

Após as solenidades religiosas, do lado de fora da igreja maior e ao redor da igrejinha vestuta, matutinhas cheirosas, vestidas de chita, travavam namoro de respeito. Era tempo de austeridade, de vergonha. Hoje é que é esse agarrado nu, às claras.
Enquanto isso, naquelas ruas pedregosas, muita gente pra lá e pra cá, de barraca em barraca. Tinha vendinhas de tudo. Desde as humildes barraquinhas que vendiam coisinhas miúdas, bugigangas, quinquilharias, etc., às luxuosas barracas dos joalheiros, onde a luz dos “Petromax” brilhava nas jóias e miçangas caprichosamente expostas em mostruários forrados na mais fina vaqueta vermelha, semelhando-as a um tesouro. Havia todo tipo de novidade: medalhas, trancelins, correntes, brincos, alianças de noivado e anéis de luxo encimados por enormes pedras coloridas.

Da Viçosa vinha os comboieiros de sempre, trazendo nos grajais, além de muitas frutas e verduras, uma ruma de batidas, tijolos, bolos “manuê” e também alguidar, panelas, potes e jarras de todo tamanho, tudo feito do mais puro barro.
Havia também os fotógrafos ambulantes e suas máquinas lambe-lambe, montadas sobre um tripé de madeira, onde a matutada se comprimia para tirar um foto exibindo seu “pincenês” de lentes escuras, junto aqueles painéis pintados com a imagem do taumaturgo São Francisco do Canindé. Meninos, como eu, eram doidos para se fotografar montado naqueles cavalinhos de madeira.

Para os que pouco lia, havia os vendedores dos livretos de literatura de cordel. E para animar, os violeiros e fazedores de rimas no mais autêntico improviso desfilavam seus repentes ao gosto do freguês. Até os botadores d’água paravam seus jumentos com ancoretas e tudo, e ficavam de queixo caído na admiração aos repentistas, enquanto os níqueis iam caindo, uma a um, nas suas “coités” dos poetas. De vez em quando se ouvia vozes diferenciadas. Eram os vendedores de ervas, raízes e daquelas célebres pomadas “milagrosas” que acabava de identificar na platéia mais um portador de uma enfermidade capaz de ser curada pelo produto em questão. Tinha remédio para todo tipo de “murrinha”.

Naquele tempo não havia festinhas, sambas. O vigário impedia tudo isso e o povo, passivamente, aceitava, com medo de ser enquadrado na categoria de subversivo. Que eu me lembre, os arrasta-pés só passaram a acontecer já de uns anos para cá, mais isso só no “Rabo da Gata”, do outro lado da parede do açude público, construído na seca de 15.

Uma noite de vadiagem, eu, em companhia de outros rapazolas, resolví escramuçar naquele palco furduncento, onde funcionava o bagaço que glorificava a “cana”. Acabei me influindo para aprender a dançar, para depois, entrar nos bailes da chamada sociedade, aqui na Granja e fui parar no “Salão” do seu Paixão. Ali arrisquei os primeiros passos, mas logo no início desisti dos ensaios. Tudo não passou de um malogro, de um fiasco, para não dizer de um desastre a minha estréia na arte coreográfica, pois logo nos começo acabei pisando nos pés do meu primeiro par, uma cabrocha da “Tiáia”, que reclamou aperreada, com os dedos todos pisados, e eu capitulei, abandonando a idéia de ser dançarino. Foi nesta mesma noite assisti, pela primeira vez na vida, um ensaio de briga de faca. Apavorado, dei uma baita carreira, ganhando o bredo, descendo, aperreado, aquelas ruas rampadas.

Mas a diversões preferidas da época eram mesmo as banquetas de jogos e os “botes” do seu Toinho Ubatuba, que todo ano ficavam instalados no largo na entrada da rua principal. Matuto ali era como confete. Todo ele pronto para se balançar naquelas barquetas de madeira."


Crônica de Raimundo "Pompe" Magalhães, publicado no Jornal Lira Granjense. (Fonte: Blogue Granja Ceará)

6 comentários:

  1. Amigo blogueiro, o Raimundinho Pompe já perdeu sua vasta cabeleira, mas continua vivinho da silva, graças a Deus.
    E continua escrevendo...

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  2. Verdade,vivinho e não saudoso.

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  3. Fiquei supreso e feliz ao saber hoje que alguns dos meus poemas e crônicas já publicado no Jornal Lira Granjense encontram-se na internet. Agradeço de coração ao amigo Lira e ao amigo e parente Pedro Magalhães pela iniciativa. Obrigado, muito obrigado!!

    Raimundo Pompe

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  4. Saudações grande Rdo Pompe,

    Eu é que fico surpreso pela demora nossa em expôr suas tão belas crônicas que nos fazem mergulhar na realidade de outrora.
    Há cerca de um ano administro este blog e ainda não havia encontrado tamanha assemelhidade com minha terrinha (Parazinho). Antes não se encontrava nada sobre aqui. Por isso amigo, venho aqui através desse e-mail, lhe pedir que exponha seu trabalho pois ele se tornará com certeza parte de nossa história pois eles narram a memória de tempos dourados. Se quiseres poderá utilizar o espaço nesse humilde blog para expôr-los quando quiser, só não deixe de manter viva essa idéia. "Quem esquece suas origens, perde sua identidade"

    Grato pela atenção e sucesso amigo, espero um dia ainda conhecê-lo.

    Atte,
    Fagner da Cruz Vasconcelos
    (admin Parazinet.com)

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  5. Acabei de ver seu comentário.Sinceramente acho que não mereço tantos elogios. Afinal, demonstarr amor á nossa terra natal, além de ser prezeiroso...é uma obrigação patriótica. Quem não tem histórias pra contar? Falar, comentar, escrever sobre noso querido parazinho é mais que obrigação...é amor a esta bela terra.
    Quando resolvi escrecer esta crônica sobre a festa de N. S. do Livramento, busquei simplesmente rememorar as festas do meu tempo de criança mais sinto que acabei indo mais além, pois além disso, acabei também resgatando os tempos de outrora e oferecendo aos mais jovens a oportunidade de saber como era a Festa de N. Senhora do Livramento, além de deixar registrada passagens e personagens que já se foram, mas que deixaram suas marcar no velho Parazinho. Tudo isso são fatos que marcaram nossas vidas e de muitos outros e que o tempo jamais apagará...´porque é como diz uma cançao de sucesso: " NADA DO QUE FOI SERÁ DE NOVO DO JEITO QUE JÁ FOI UM DIA"
    Obrigado!!

    PS: Não sei se vc percebeu mas a publicação desta Crônica encontra-se incompleta no seu final. Se eu lhe for útil poderemos efetuar a correção.

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  6. Sds!!

    Muito grato pela colaboração. Claro que aceito sua ajuda amigo!!!
    Aguardo seu contato e queria que o Sr. entrasse em contato comigo para traca de informações pelo e-mail ou pelo msn (parazinet@msn.com). Pois estou elaborando um histórico de fatos importantes locais e creio que a sua colaboração seria de fato essencial para que possamos manter viva esta história de nossa terrinha.

    Muito obrigado e Saúda caro mestre.

    Atte,
    Fagner C Vasconcelos
    admin

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