Após 22 Dias à Deriva, Pescadores São Resgatados em Santa Catarina
Foram 528 horas no mar, sem destino, sem comida, sem água e com muito frio. Na maior parte do tempo, só havia água salgada em volta e urina para beber. Ninguém acreditava que voltariam, muitos optaram por não resgatá-los e até a Capitania dos Portos suspendeu as buscas. Mas, desaparecidos há 22 dias, seis pescadores capixabas foram resgatados na segunda-feira no Sul do Brasil.
Eles haviam saído de Cabo Frio, na Região dos Lagos, em 27 de maio, e foram encontrados, desidratados, próximo da divisa entre Santa Catarina e Paraná, a 220 km da costa e mais de 500 km do Rio de Janeiro. Foram resgatados por um navio mercante italiano que atendeu ao pedido de socorro emitido pela Marinha.
A embarcação Marola, com cerca de 20 tripulantes, havia deixado Rio Grande (RS) com destino a Trinidad e Tobago. Os italianos, segundo o comandante da Capitania dos Portos, capitão Walter Bombarda, desviaram do curso para resgatar os náufragos. O navio levou os pescadores até um posto da Marinha próximo da Ponte Rio-Niterói, de onde foram buscados, de lancha, por militares da Capitania e por bombeiros.
Na base, familiares aguardavam ansiosos. A lancha chegou e os sobreviventes foram levados, um a um, para as ambulâncias. Três precisaram de macas; os demais caminhavam com dificuldade. O mais velho, Gilnei da Silva, de 56 anos, foi o último a sair – e dispensou a maca. “Passei muito frio. Ficava na parte de baixo do barco para esquentar”, disse.
O mais novo, Maicon Lima, de 24 anos, lembrou dos dias difíceis à deriva: “A comida acabou, a água também. Tivemos de beber urina.” Segundo ele, barcos que foram avistados pelo grupo não prestaram ajuda. “Mesmo assim, não perdemos a esperança.” Sentada na ambulância, abraçada ao filho e chorando, a mãe de Maicon, Maria das Graças, de 53 anos, disse que, no que depender dela, o jovem nunca mais vai pescar.
“O que mais limita a sobrevivência é a água salgada. Ela é predatória à fisiologia humana, não dá para beber. Não hidrata, pelo contrário. Há também a desorientação mental depois de 3 a 5 dias. Mas o pior é quando não restam comida e água, é quando acaba a esperança. Felizmente, eles não desistiram de viver”, disse Bombarda.
Viagem
Os pescadores deixaram Itaipava (ES) em 16 de maio com destino a Cabo Frio. No dia 27, na cidade fluminense, embarcaram novamente. Em 1.º de junho, após cinco dias coletando iscas perto da costa, voltaram para o mar aberto, de onde planejavam voltar no dia 9.
Segundo o oceanógrafo David Zee, da UERJ, a uma distância de 90 km (onde fizeram o último contato), eles “estavam na área da Corrente do Brasil, que tem direção norte-sul, o que explica terem sido encontrados próximo de Santa Catarina e Paraná”.
A Capitania dos Portos abriu inquérito administrativo para apurar o que aconteceu com o barco. Se houver irregularidade, o processo pode resultar em sanção administrativa, multa e até cassação da licença do mestre.
O barco, uma traineira de 12 metros, comprado há oito anos e com a documentação em dia, foi deixado para trás pelo navio italiano. Segundo os sobreviventes, o motor “quebrou”.
Indagado se a embarcação já tinha apresentado defeito, o dono, Pedro Gilson, de 50 anos, disse que “problemas sempre acontecem”. “E estamos sempre consertando. Foi uma fatalidade. No dia 8 houve um vento forte, mar alto, ressaca e isso pode ter provocado o problema.” Por contrato, ao fim de cada viagem, os lucros com a venda do peixe eram divididos igualmente.
informações do Estadão.com